terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Poema do velho de barbas brancas

Havia um velho de barbas brancas
Que vivia numa cabana
À beira de um ribeiro
Debaixo de um eucalipto.
Como eu gostava dele,
Da sua voz calma,
Do seu olhar sereno,
Do seu sorriso claro!
Passaram muitos anos...
O ribeiro já não existe: foi atolado.
O eucalipto já não existe: foi abatido.
Só o velho de barbas brancas
Permanece bem vivo
Dentro do meu coração!
-
In "As Palavras são de Água"

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Sophia De Mello Breyner Andresen

Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade.
Terror de te amar
Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo.
Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa.
Este é o tempo
Este é o tempo
Da selva mais obscura
Até o ar azul se tornou grades
E a luz do sol se tornou impura
Esta é a noite
Densa de chacais
Pesada de amargura
Este é o tempo em que os homens renunciam.
Biografia
Tive amigos que morriam, amigos que partiam
Outros quebravam o seu rosto contra o tempo.
Odiei o que era fácil
Procurei-me na luz, no mar, no vento.
As pessoas sensíveis
As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas
O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra
O dinheiro cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada
Porque não tinham outra.
« Ganharás o pão com o suor do teu rosto»
Assim nos foi imposto
E não:
« Com o suor dos outros ganharás o pão».
Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito
Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem.
( Do livro Cem Poemas de Sophia )
- já antes postado -

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Não há lugar para as mágoas!

É com elevação o sentimento de unidade
Que sinto no universo com os seres que amo,
Com quem falo no silêncio uma linguagem de amor
Respeitosa, sublime, musical, bater de asas leves,
Harmonia reunida em catedral de rosas,
Carícias perfumadas, roçagar de mãos como véus,
Os sorrisos são a música dos regatos,
Suavidade de lua quando acaricio os teus seios...
É estranho! Não há lugar para as mágoas!!...
-
In : As Palavras são de Água

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

É do amor que falo

A dádiva total dos corpos às águas
Que desabam das montanhas.
A vitória dos peixes sobre as pedras.
O riso do sol face ao espanto
Do corvo hierático sobre as rochas.
Canto a placidez das cegonhas
Sobre as calmas enseadas,
O rumorejar dos barcos,
O farfalhar dos choupos,
A correria infantil dos cães
Sobre as areias inclinadas dos rios.
É do amor que falo.
Do riso contra a bruma.
Do teu corpo liberto
Dançando violento sobre o verde
Onde os insectos enlouquecidos
Incomodam a casa que arde
Nas veias do centro da terra descoberta.
Beijo líquido e resinoso à sombra do mês de Abril
Que aspira o aroma do rosmano, das estevas e
Das urzes,
Nudez agreste e calma.
Canto contra a morte
Que nem lembro.
Renasço, pleno, babado de raízes.
Admiro o céu,
As águas sobre o corpo.
Ainda há pouco chorava como um ramo
Em orvalho de manhã
O sonho de ser água.
Criança sem mais nada que o riso numa taça.
A eloquente solidão,
A festa que dança com teu corpo nu e vitorioso
Sobre as dunas...
Quão difícil foi chegarmos à dança com que
Danças,
Sem tempo sobre o tempo!
Difícil, sim, difícil, foi crescermos e nascermos
Para o riso
E para a espuma
Espantada com a leveza das palavras
E o regresso ao vento aberto,
Às ânsias do sol-posto,
Aos dedos,
Loucos de inocência,
Descobrindo as grutas sobre a pele.
A noite já chegou
E eu não tenho mais palavras, meu amor,
Senão conchas em repouso sobre as rosas do
Regresso.
Ajuda-me a escrever este poema de amoras
Mansas, livres,
Com gestos de silêncio,
Com cansaços de quem merece as madrugadas!...
-
In As palavras são de água
. Foto Net

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Como se fosse um sem abrigo!

Bato a Tantas portas
Do Saber e da Poesia!
Leio Tantos Poemas
Que são espelhos
Onde o rosto com as mãos carentes de
Um afago maior
Do que a amplitude do meu corpo
Se sentem mais firmes
Do que a verdade do que sentem!
Mas termino sempre só
Como mendigo
Ou cão perdido
À porta duma casa abandonada
- a minha casa -,
Onde acordo,
E prostrado,
Envergonhado,
Me sinto,
Como se fosse um sem abrigo!
-
Os caminhos do silêncio
-
Lx, Nov. 2010
-
Foto Net

sábado, 27 de novembro de 2010

O voo da águia

A águia sobe cada vez mais alto,
em seu voo descobre os quatro cantos da Terra.
De súbito, no meio do céu,
quebra-se o voo,
debatem-se suas asas cansadas,
a águia cai.
Mas o vento, agitado pelas asas,
continuará voando para além dos séculos.
-
In, POEMAS DE LIBAI
-
Nota: este poema data de 745 e foi dedicado a Li Yong ( 678 - 747 ), grande calígrafo, na altura governador de Beihai, na actual províncioa de Shandong.
-
Foto Net

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Ao entrares no Templo do Amor

Como posso individualizar o amor pleno, eterno, sem tempo, sem limites e sem nome?
Como posso colocar o teu nome no Templo do poema que dissolve todos os nomes na taça pura do amor infinito?
Ao entrares no Templo do Amor o poema que te escreveu apenas te acena indelével comovido por entrares e não o veres, a ele, que te criou, com o cinzel de fogo que o Amor Maior lhe concedeu!
Assim, todos os meus poemas,sem falarem de amor,são de amor, sobre o amor, escritos com amor, mas não incluem o teu nome, amor...
-
" Os caminhos do silêncio "
-
Foto minha

sábado, 13 de novembro de 2010

Aos amigos verdadeiros

Presenças discretas,
Silenciosas,
Muitas vezes invisíveis,
Cintilantes,
Não parecem calorosas
Nem ardentes,
Mas são certas,
Sóbrias,
Permanentes.
-
Muitos de nós só o sabem
Muito tarde!
Poucos o sabem,
Cedo!
-
São como estrelas vigilantes
Nos céus das nossas vidas
Tantas vezes distraídas!...
-
Seres sublimes,
Luminosos,
Sensíveis,
Tão fortes,
Mas tão frágeis,
Corações que sofrem
E cantam
E rejubilam
Em silêncio...
-
Nada nos exigem!
Nada regateiam!
Apenas nos amam...
- São os amigos verdadeiros!...
-
In " As palavras são de água "
-
Foto Net

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

2 poemas de Isabel Mendes Ferreira

( Foto minha - águas d0 Guadiana em Mértola)

1.

-

de água. de muita água. preciso. para improvisar outra ardósia sem estilhaços nem balas nem punhais. onde inscrever outra terra. e ser de novo licor e musgo. insidioso o caminho para a montanha. infiel luar e resgatar falsos poderes. de água. de toda a água. preciso. para cuspir a saliva de um cavalo moribundo. três tiros bastam. para te salvar. frenética criatura d0 sótão da agonia. -------------------- país errante.

sobre a mesa deixo o registo. álgido. em ruínas. errância da água.

( Foto de Lucília Ramos - águas de Vilarinho - http://lucy-natureza.blogspot.com )

sim. como Caeiro. " a única coisa que fazia por si era andar pelos caminhos do mundo, para que os outros, e a chuva e o sol e o vento, lhe dessem encontrões"

-

assim deambulamos desprendidos e dissolutos sobre as escamas.

arranhando a trágica elipse do tédio. preciso de toda a água. para ser faina de cal.e foice---------------------------------------------------------

-

----------- e assim legendo um nome . que à mercê das águas é memória.

aguda e opulenta. as coisas vivas primitivas e ardentes irrompem. fulvas de sabedoria.

e

porque a evidência é o contrário do sentimento

des.sinto este país.

em evidente falência. nua. ---------------------- sentida na pele.

-

incompetente círculo. rigoroso destino que hiberna. cansado branco

e cego

vertiginosamente traído.

-

as coisas vivas primitivas e ardentes -------------- ardem. e resistem.

-

e se o " corpo do eu " é entidade que pensa ---------------- que pensa este

país?

imperial curva que se curva à roda dos nulos.

-

2.

-

( Foto Net ) aloendro

talvez esmague buganvílias e cerre as pálpebras. talvez encha de

amoras o seio da tarde e finja ser pirata nas tuas mãos. talvez.

-

talvez volte de azul ou de noite ou de branco. talvez de abismo

líquido e profundo no retorno das giestas sem flor e dos vales oblí-

quos. talvez dos cheiros da montanha a cavalgar a face oculta da lua

e das areias. talvez a respiração ampla e gráfica das tuas mãos nos

meus ombros.

modulação sensível da neve e das fontes. os teus olhos. talvez volte.

talvez venha de aloendro.

- Isabel Mendes Ferreira, in " As Lágrimas Estão Todas na Garganta do Mar "

sábado, 6 de novembro de 2010

E os outros...

O que pensam?
O que sentem?
O que sonham?
O que riem?
O que choram?
O que calam?
O que sofrem?
-
Lx, Nov.2010
-
" Os caminhos do silêncio "
-
Foto Net

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

O rosto do vento

Gosto da calma das noites
Após a guerra dos dias,
Mas sinto sempre a grande solidão do mundo
Estampada no rosto do vento
Que conhece os segredos
De todos os caminhos...
-
In " As palavras são de água "
-
Foto Net

domingo, 31 de outubro de 2010

Chuva, antiga ...

Foto Net
Chove e gosto; e sinto, sempre, que o som da chuva é muito antigo; e que chove sobre a terra , sobre mim e sobre o mundo, e eu sou a terra, o mundo, o tempo, a chuva e o som da chuva. Há, no som da chuva, que cai sobre mim, ao ouvir a chuva, o tempo da chuva e o tempo do mundo e o tempo do tempo e o tempo de mim!...
É como se eu fosse da idade da chuva, da idade da terra, da idade do mundo, da idade do tempo, e por isso não me basta dizer: chove, e é bom ouvir a chuva, etc...Porque algo me faz lembrar o inlembrável e ao dizer isto sei que não é construção da mente para efeitos estilísticos...Não!...É sentimento. Antigo. Como a chuva. E o tempo...
Desde quando choves, chuva, e sobre mim roças lembranças que não desvendas?!...
-
" Os Caminhos do Silêncio " - Lx, 30/10/10

sábado, 30 de outubro de 2010

RILKE (2)

Sobre a Natureza
-
"Brincamos com forças obscuras que não podem ser capturadas com os nomes que lhes damos, como crianças brincando com o fogo, e por um momento é como se toda a energia tivesse permanecido dormente na totalidade dos objectos até agora, e eis que chegamos para aplicá-la na nossa vida fugaz e nas suas exigências. Mas, repetidas vezes ao longo de milénios, essas forças livram-se dos seus nomes e erguem-se como uma classe oprimida contra os seus pequenos senhores, ou nem mesmo contra eles - elas simplesmente erguem-se, e as diversas culturas deslizam dos ombros da Terra, que se torna novamente grande, vasta e sozinha com os seus oceanos, árvores e estrelas.
O que significa o facto de transformarmos a superfície mais externa da Terra, embelezarmos as florestas e os prados e extrairmos carvão e minerais da sua crosta, de recebermos os frutos das árvores como se fossem destinados a nós, se nos lembrarmos pelo menos de uma única hora em que a natureza agiu além de nós, além das nossas esperanças, além da nossa vida, com essa sublime nobreza e indiferença que preenchem todos os seus gestos? Ela não sabe nada de nós. E, não importa o que os seres humanos tenham realizado, não há um deles que haja alcançado tamanha grandeza a ponto de a natureza dividir com ele a sua dor ou unir-se a ele no seu júbilo. Por vezes, a natureza acompanhou momentos grandiosos e eternos da história com a sua música potente, ensurdecedora, ou os ventos pareceram parar na iminência de uma decisão, toda a natureza quieta, com a respiração em suspenso, ou ela rodeava um instante de felicidade social inofensiva com florações ondulantes, borboletas voando de um lado ao outro, ventos saltitantes - mas apenas para se desviar no momento seguinte e abandonar aquele com que, há pouco, tudo parecia compartilhar."
-
"O mais extremo e profundo de que as grandes coisas da arte são feitas reside em toda a natureza; ele cresce com todos os campos, todas as cotovias sabem disso, e nada senão ele faz as árvores florescerem. Mas ele está oculto ( enquanto nos objectos de arte é erguido em silêncio absoluto - como um ostensório ), está disseminado e quase perdido ( enquanto as coisas de arte o contêm: reunido, reencontrado, para sempre preservado ). E o caminho do nosso desenvolvimento, um caminho difícil, árduo, obstruído por centenas de circunstâncias, é também reconhecer o grande, o espiritualmente necessário, o infinito, enfim, onde o mais extremo e profundo não pode ser capturado por um olhar, onde é quase impossível agarrá-lo, a não ser por um trabalho de gata borralheira. A vida é severa e madrasta como a rainha má do conto de fadas; mas ao mesmo tempo não lhe faltam as forças amáveis diligentes que acabam por realizar - para quem é bom e paciente- o trabalho de fazer sozinho."
-
"O que captamos como primavera , Deus o vê como um sorriso fugidio,pequeno, que passa sobre a Terra. A Terra parece lembrar-se de alguma coisa, que no verão ela conta a toda a gente, até que se torna mais sábia no grande silêncio outonal com que faz confidências aos solitários. Todas as primaveras que ambos já vivemos, reunidas, ainda não bastam para encher um segundo de Deus. A primavera que Deus assinala não deve ficar apenas nas árvores e nos prados, mas precisa, de alguma maneira, tornar-se poderosa nas pessoas, pois então ela ocorre, por assim dizer, não no tempo, mas na eternidade e na presença de Deus."
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" É difícil viver neste mundo porque há pouco amor entre a Natureza e o Homem e entre o Homem e Deus. O Homem não precisa de amar nem a natureza nem Deus - mas deve comportar-se em relação a Ele do mesmo modo que a natureza o faz. "
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Rainer Maria Rilke
In, " Da Natureza, Da Arte e Da Linguagem"
-
Fotos de À Beira de Água tiradas na Ilha de S. Tome
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REEDIÇÂO - dedicado à Rita que regressou definitivamente de S. Tomé

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Rainer Maria Rilke (1 )

1. Sobre a Arte -
" Veja: não quero separar com um rasgo a vida e a arte: sei que em algum momento e lugar elas estão de comum acordo. Mas sou um desajeitado na vida, e, por tal razão, quando a vida se estreita ao meu redor, isso com frequência é uma estagnação para mim, um retardamento que me faz perder muitas coisas tal como às vezes num sonho quando não se consegue acabar de se vestir e, por causa de dois botões teimosos no sapato, falta-se a um evento importante e único. E também é verdade que a vida se move e realmente não deixa tempo para faltas e muitas perdas, especialmente para quem deseja desfrutar da arte. Pois a arte é uma coisa muito grande e muito difícil e muito longa para uma vida, e aqueles que têm idade bem avançada são apenas iniciantes nela. " Foi aos 73 anos que mais ou menos compreendi a forma e a natureza verdadeira dos pássaros, dos peixes e das plantas" - escreveu Hokusai, e Rodin sentiu o mesmo, e também se pode pensar em Leonardo, que ficou bastante idoso. E eles sempre viveram na sua arte e, reunidos em volta dela apenas, deixaram tudo o mais ser coberto pela vegetação. Mas como não deveria ter medo alguém que raramente vai ao seu santuário, porque cai nas armadilhas exteriores da avida agitada e se choca insensivelmente em todos os obstáculos? É por isso que quero encontrar o trabalho, começar o dia útil de forma tão ardente e impaciente , porque a vida só se pode tornar arte quando primeiro se torna trabalho. Sei que não posso cortar a minha vida dos destinos com que se emaranhou, mas tenho de encontrar a força para erguer a vida totalmente, tal como ela é, com tudo, para dentro de uma quietude , de uma solidão, do silêncio de profundos dias de trabalho. "
-
" Segurança além daquela que se encontra na poesia, na pintura, na equação, no edifício e na música talvez possa ser alcançada apenas pelo preço da mais definida delimitação. E uma pessoa estabeleceria tal segurança cercando-se e contentando-se num segmento escolhido do mundo, fruto de reflexão ou experiência , num ambiente de familiaridade e significação, em que um imediato uso de si mesma se tornasse necessário e possível. Mas como poderíamos desejar isso? A nossa segurança deve , de alguma maneira, tornar-se uma relação com o todo , com uma plenitude; ser seguro significa para nós tornar-se consciente da injustiça e admitir a realidade do fenómeno do sofrimento; significa rejeitar nomes para reverenciar por trás deles as criações e as conexões únicas do destino, como convidados; significa permanecer imperturbável em relação ao alimento e à privação, até ao fundo da esfera espiritual, tal como com relação ao pão e à pedra; significa não suspeitar de nada, não expulsar nada, não considerar nada para o outro; Significa viver, para além de todo o conceito de propriedade, em apropriações ( não proprietárias, mas alegóricas ). E, por fim, embora isto não se aplique ao âmbito burguês, fazer-se entender a respeito desta segurança ousada: ela é, afinal, o último ponto em comum, da fundação das nossas ascensões e declínios. Conceber a insegurança nos maiores termos - numa insegurança infinita, a segurança também se torna infinita..."
-
" Realmente há uma diferença entre a arte como um modo de viver ou apenas como uma ocupação. A primeira é, no entanto, tão imensa, tão lenta e talvez alcançável só na velhice que não vejo razão alguma para se colocar entre as pessoas que usam esse estranho nome. Só os realmente grandes são artistas nesse estrito, mas exclusivamente verdadeiro sentido de que a arte se lhes tornou um modo de vida - todos os outros, todos nós, que apenas ainda nos ocupamos com a arte, deparamos uns com os outros no mesmo vasto caminho e saudamo-nos com a mesma silenciosa esperança e ansiamos pela mesma remota mestria..."
Rainer Maria Rilke In " Da Natureza, Da Arte e Da Linguagem " - Reedição -
As aguarelas são da autoria de Joseph Edmund Pedro, cujo nome artístico é: JOED, ( DeBary - Florida, USA), a quem mando um forte abraço extensivo à sua esposa, Karen.
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O " Bold " é da responsabilidade do autor do blog

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Parabéns

Mas que bela surpresa!

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Cavalgando as sílabas do silêncio

(Foto de Maria Augusta Aleixo)
Preciso do tempo para o meu tempo como se não tivesse ( houvesse ) tempo. Único espaço onde respiro e me sinto livre. Nem preciso de espelho para me ver o rosto que tenho e ser a respiração que respiro. Pode existir ruído, mas só o silêncio se ouve. Catedral de espaço ilimitado. Autenticidade cinzelada a sulco de lâmina no jade mais profundo e puro. Arco luminescente giza o discurso língua vibrante entre o céu e a terra, entre as águas e o fogo, entre a vida e a morte. No céu desta boca de lume me vejo e falo e me atasco leve e me voo semente na terra amada e sulco as águas bote por janelas de vagas onde assomo as corolas ronronantes do mistério. No centro desta boca ventre sou eterna criança não nascida com memórias sem palavras e receios de esquecimentos de um tempo ainda por nascer! Mas tudo decifro cavalgando as sílabas do silêncio que enche como almas velhas ondulantes o espaço sem tempo da catedral sem nomes, diluídos nos altares do amor pleno.
-
" Os caminhos do silêncio"

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A ÁGUA NO MUNDO

Na minha infância, ia sempre, com o meu pai, todas as semanas, buscar água aos poços e às fontes, que havia nas aldeias do concelho da minha terra, em Mértola, no Alentejo. Quanto às águas do rio, o Guadiana, que banha Mértola, corriam limpas e eram transparentes. Os peixes, abundavam, e gostava de vê-los vencendo a força das cataratas em direcção à nascente, procurando os fundos de seixos ideais para a desova. Durante o inverno o rio galgava as encostas íngremes e formava cheias de cor acastanhada, espectaculares, e era assim que, de acordo com as leis da natureza, as águas fertilizavam os solos e, baixando depois, recuperavam os tons claros e leitosos, dando a sensação de rio com cara mais lavada. Quando eu era pequeno havia muita miséria e desequilíbrios sociais profundos, mas existia o equilíbrio e a aproximação entre os homens e a natureza. Não havia falta de água ! Hoje... As fontes ainda existem, mas contaminadas. As águas do Guadiana já não são as mesmas, têm sinais de poluição, e é habitual em certos períodos não ser recomendável comer-se o peixe mais popular e resistente, que é a "tainha", e que, na minha terra, se chama, "muge". Há muitas espécies de peixes que já não sobem o rio para a desova, com a frequência e a quantidade de antigamente, como é o caso do " sável". E por vezes surgem peixes mortos boiando à tona da água. A poluição é, como sabemos, fruto da ganância dos homens, que preferem o crescimento económico desenfreado ao desenvolvimento harmonioso da economia. As águas do rio já não galgam as encostas, já não existem as cheias que regulavam todos os anos a actividade do seu caudal e as águas são de uma cor esverdeada...
Com o êxodo rural e o crescimento das cidades as necessidades humanas cresceram e o egoísmo também. Hoje é sabido que os gastos em água são exorbitantes nos países desenvolvidos, mas a água é cada vez mais um bem escasso. Estudos recentes indiciam que a água será um problema social e político grave dentro de pouco tempo.

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Lembro-me de Exupéry que, nos seus livros, falando no deserto, enaltece o valor milagroso de uma laranja !...
Uma laranja no deserto, repartida, saboreada, sugada milimetricamente...
O valor da laranja para quem, com sede, sozinho, se encontra no deserto...
Isto faz-me pensar que, com a escassez da água, no deserto pobre material e espiritualmente falando do mundo próximo-futuro, uma gota de água é como a laranja disputada de Exupéry....
Bem pior!
Porque uma gota de água... como se parte, como se divide?
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Muito há a fazer para que a água não diminua e não se transforme numa gota...
Para isso há que despertar a consciência dos homens...
É o que se pretende neste dia.

Recebam a minha humilde contribuição para esse propósito.

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Eduardo Aleixo

sábado, 9 de outubro de 2010

Casa com orelhas grandes

Como gosto da minha casa
Pequena,
Com orelhas grandes,
Para escutar
A sinfonia
Do mar!...
-
In " As palavras são de água "
-
Foto minha

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Só nos sonhos vens

Só nos sonhos vens
tu que não vejo e com quem não falo
há tanto tempo
Surges de vez em quando nos sonhos que tenho
sempre calma e não sei se falamos
mas acho que sim
não sei
sei que és uma presença serena
sinto no sonho a perfeição
a harmonia
se falamos ou não
não sei
mas não me lembro de palavras
lembro sim de gestos
mas tudo suave
a encher o coração
que pelos vistos não dorme
será a alma?!
não sei
sei que assim devia ser no mundo chamado do real
sei que o mundo chamado do real é a nascente do sonho
mas também sei que é esta oposição que dá valor ao sonho
mas também penso
que as nossas almas se encontram
e já decidiram
- será?!
que é melhor assim
a gente encontrar-se no sonho
e acordarmos com a sensação doce e suave e feliz
de que mais vale o encontro nos sonhos
do que na vida
onde se nos encontrássemos
nenhuma palavra já nos traria a paz
porque já não sabemos usar as palavras.
Então
bem melhor será que nos encontremos nos sonhos...
Será que... se me leres... as palavras que digo se transformam em verdadeiras?
Isto é: será que também sentes que te encontras comigo nos sonhos?
Ah!!
Se me leres e nada sentires, o que escrevo é indubitavelmente delírio
ou expressão de desejos inconscientes!
Se sentires o que digo, ficas a saber que não vale a pena
trocar o mundo dos sonhos por qualquer encontro em qualquer local
do mundo onde habitamos.
E se nos encontrarmos, poucas palavras devemos proferir, apenas as
indispensáveis. Aliás, como disse, já nem sabemos usar as palavras!
Se nada sentires, deixa-me dizer que os encontros nesta vida
deveriam ser como aqueles que tenho contigo nos sonhos !
-
" Os caminhos do silêncio "
-
Foto Net

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Como não sorrir sequioso...

No fim sem fim dos caminhos fatigados
Surpresa e dolorosamente renascidos
Nos interstícios das rochas
Nos becos labirínticos das grutas
Nos recantos espinhosos dos conflitos
Brisas subterrâneas sibilinas
Pétalas de esperança,beijos, carícias, aromas
Para além das curvas sombrias dos túneis
Tão longo o caminhar em direcção à sinfonia das ondas!
Como não sorrir sequioso
Para o sorriso materno da manhã
Ou deitar-me no colo das areias despidas
Mas tão cheias à beira do mar!?
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Lisboa, 13/9/2010
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Caminhos do silêncio
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Foto minha

sábado, 25 de setembro de 2010

O afago sublime das estrelas

O silêncio da noite fala
liberto.
O mesmo diria da madrugada
ou do sorriso das pétalas acordadas
pela dança sincopada dos insectos.
Há segredos bem audíveis
antes do acordar dos pássaros,
que a mente não percebe
mas a brisa e as flores compreendem
e enchem o coração infinito
da alma!
Coisas tão pequenas e tão leves
mas tão plenas!
Que riqueza existe
sem nenhum padrão de medida
a não ser o da eternidade
e o do sem limite!...
É noite,
(mas poderia ser de madrugada)
e recebo no tosco de mim
o afago sublime das estrelas
e tão grato fico
e tão sábio me pareço!
E tão calmo estou!
-
Os caminhos do silêncio
-
Lx, 5/8/2010
-
Foto Net

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Namíbia...

( Deserto )
Durante duas semanas tive a oportunidade de sair da pequena ilha no equador rumo a um país enorme – a Namíbia. Situada na costa entre Angola e a África do Sul, a Namíbia conquista as pessoas pelas suas diversas e belas paisagens, pela sua natureza e preservação da vida animal selvagem e pelo deserto. As primeiras impressões que tive, curiosamente, foram a estranheza de parecer estar no Alentejo, pela secura e longas planícies desérticas do sul. Isso quase me fez sentir em casa! Aluguei um carro e cada dia fazia no mínimo uns 400 km para chegar a qualquer destino. Posso dizer que passei mais tempo dentro do carro e a conduzir do que a caminhar. Mas mesmo assim não foi possível visitar tudo…
A Namíbia foi uma colónia Alemã e, até à década 90, esteve sob domínio da África do Sul. Isso justifica o elevado número de descendentes Africans e Alemães que lá vivem, mas não deixou de me chocar a existência de tantos brancos a falar alemão ou africans em cidades bem organizadas, com supermercados, bancos e grandes vivendas. Claro que depois percebi a enorme disparidade social existente. Existe uma barreira entre o norte e o sul do país que impede os animais vindos do norte entrarem na zona sul, devido a uma série de doenças que chegaram dos territórios de Angola (segundo explicaram). É igualmente impressionante como essa barreira animal marca a divisão de dois mundos na Namíbia. No sul, tudo muito bem organizado e influenciado pela cultura alemã, onde vivem muitos brancos e onde se encontra também a zona do deserto e a zona restrita dos diamantes.
( Fronteira com Angola - Rio Cunene )
O norte, pobre, mas com mais recursos de água e portanto mais verde, onde se encontram ainda as antigas tribos nómadas, criadoras de animais, que tive a oportunidade de ir visitar. Uma das grandes etnias aí residente são as himbas que são muito conhecidos pois as suas mulheres andam apenas com uma pele à cintura e usam uma pasta ocre na pele que as faz ter uma cor diferente e um cheiro muito característico. Nunca tomam banho em toda a vida. E na cidade do norte, capital desta etnia – Opuwo – circulavam com a maior naturalidade pelos supermercados e bancos! Mas o que mais gostei foi das reservas e da possibilidade de estar próxima de animais e da vida selvagem. Vi pela primeira vez girafas e zebras, diversos tipos de antílopes, gnus e rinocerontes. Vi também elefantes, chitas e chacais. Só não tive a sorte de ver leões… Mas a proximidade da vida selvagem faz-nos estar mais perto do mundo natural e reconhecer a importância da preservação e de que fazemos parte de um ecossistema maior, do qual muitas vezes nos esquecemos existir (e que conhecemos através do zoo). Recomendo vivamente. Foi uma viagem memorável.
Bjs a tod@s Rita

( Cubata da etnia Himba )

- Fotos de Rita Aleixo

terça-feira, 7 de setembro de 2010

ECOS...

As vozes das almas calam-se face à inundação alienada dos ecos que ressaltam sobre as montanhas da pele. O ruído que provocam faz cair as brumas sobre o anúncio de todos os sentimentos verdadeiros.
Há que partir da voz original e que ela não se perca.
Só ela fala das águas puras do interior das rochas e deixa ver o essencial do mundo.
É demasiado o ruído e este faz tremer as pontes entre as águas soltas e as que correm transparentes no ventre secreto da terra.
Por isso fujo dos ecos prevelacentes sobre os poros das encostas da pedra.
Prefiro a voz pura, tosca, mas original, que se eleva na madrugada como as névoas na superfície das águas quando o sol desce no vale e vai no bico das cegonhas dizer o que a alma diz sem outra pretensão que não seja :
- estou aqui, só, debaixo do céu, mas acompanhado por todo o amor do mundo!
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Lx, 27/8/2010
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" Os caminhos do silêncio "
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Foto minha- Mértola, Agosto 2010

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Nada pode impedir o nascimento das estrelas

É difícil destronar as primeiras palavras!
Impensadas!
Seres
que nasceram do nada!
A mente não as destroi!
A sua força vem da fonte
das origens
do fundo do ser.
Não foi por acaso que nasceram:
estavam destinadas
a serem os alicerces do poema!
Como água das nascentes
ou lava dos vulcões
ou beijos apaixonados
ou frutos maduros da terra
nada pode impedir
o nascimento das estrelas
ou da criança
quando chega o tempo
de nascer!
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Lx, 25/8/2010
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" Os caminhos do silêncio "
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Foto minha

sábado, 28 de agosto de 2010

Muitos barcos vazios com remos à espera

Pontes destruídas
Caminhos abandonados
Destinos
Que são sombras
Ilhas
Na Ilha
Espreitando outras sombras
Nas areias
Do outro lado!...
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Separando as sombras
Águas vivas
E muitos barcos vazios
Com remos à espera
E pássaros incansáveis
Cantando a melodia dos abraços
Entre as margens!...
"Os caminhos do silêncio"
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Lx, 21/7/2o10
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Foto Net

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Adormeço ao lado das árvores

É noite.
Fecho os olhos.
E adormeço ao lado das árvores.
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Brejenjas, 25 de Agosto
~-
Foto Net
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Os caminhos do silêncio

domingo, 22 de agosto de 2010

Sobre os seixos da vazante

É luz a música dos pássaros
No teclado dos ramos
Ou nas folhas dos plátanos
Que poema descreve
O cantarolar do riacho
Na garganta das pedras
Ou que palavra
No silêncio das noites de Agosto
A catarata das águas
Sobre os seixos da vazante
E as montanhas de xisto
Vestidas de silêncio
E eu deitado na tenda
Com todos os sonhos do mundo
Nada sabendo da vida
Deleitado
Na música das águas
Com a lua mexendo no bico dos cerros
E sem saber
Que esta música
E este silêncio
Ficariam para sempre no meu coração!...
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5/8/2010
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" O tempo nas palavras "
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Foto da ilha de S. Tomé - perto da Roça Bombaim- 6/2008

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Parabéns, Rita

Passa um dia feliz nessa terra, Namíbia, cujos encantos estás agora a descobrir!
Esperamos as tuas reportagens e fotos.
Com todo o amor e carinho.
Saudades dos teus pais.
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Fotos Net

sábado, 14 de agosto de 2010

Poema Canção da minha ternura

Rondaste o meu castelo solitário
Como um rio de vozes e de gestos;
Baixei as minhas pontes fatigadas
E conheci teus lumes, teus agrados,
Teus olhos de ouro negro que confundem;
Andei na tua voz como num rio
de fogo e mel e raros peixes belos;
Cheguei na tua ilha e atrás da porta
me deste o banquete dos ardores teus.
-
Mas às vezes sou quem volta
a erguer as pontes e cavar o fosso
e agora em sua torre, ternamente
sem mágoa se debruça nas varandas
Vendo-te ao longe, barco nessas águas,
Querendo ainda estar se regressares
Porque seria pena naufragarmos
Se poderias ter, sem tantas dores,
viagens e chegadas nos amores meus.
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LYA LUFT
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Poema cedido pela amiga Água do Mar a quem peço que LYA LUFT venha ler a ver se gosta de aqui se ver!
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Foto Net

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Senhora cegonha

Lá traz a cegonha
no bico raminho
de meia encarnada
vem dando chegada
ao seu velho ninho!
-
Senhora cegonha,
como tem passado?
Não há quem a veja,
lá vai prá igreja,
poisar no telhado...
-

No seu velho ninho

ponha ovos ponha...

Que seja bem vinda,

Branquinha, tão linda,

Lá vem a cegonha!

-

Em chegando Agosto

um bando levanta

anunciando a hora

de se ir embora,

leva o meia branca...

-

Senhora cegonha,

como tem passado?

Não há quem a veja,

lá vai prá igreja

poisar no telhado...

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Folclore musical do Baixo-Alentejo

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Para ouvir no You-tube, em Senhora cegonha,

Grupo Coral de Cantares Regionais de Portel

- Foto minha

domingo, 8 de agosto de 2010

Estás longe-perto

Onde estarás?
Só depois de partires
É que melhor te conheci
E mais te amei.
Estás algures longe-perto.
Será que um dia nos vamos encontrar
Quando eu partir para esse lugar?
Amo-te.
Faz hoje anos que partiste.
Tanto te amei.
Devia ter-te amado mais.
Mas há coisas que só vemos depois!
Tu sabes quais são!
Tens escutado a minha voz
E o meu pensamento.
Estás longe-perto!
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Mertola, 7/8/2010
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Os caminhos do silêncio
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Foto minha

terça-feira, 3 de agosto de 2010

As eleições legislativas em STP

No passado domingo, realizaram-se as eleições legislativas em São Tomé e Principe e é a primeira vez que tive a oportunidade de acompanhar o processo eleitoral e partidário nesta realidade...E posso dizer que foi muito interessante, umas vezes divertido, outras chocante. Começou na campanha, com o fenómeno que aqui se intitula "Banho", e que significa literalmente dar dinheiro ás pessoas para votarem no seu partido. Ora eu pensava que não teria oportunidade para presenciar esse Banho, mas este afinal é tão claro e declarado que deparei-me com várias situações desse género. Nas roças, é só chegar um carro que vem toda a gente a pedir pelo seu banho, não interessa quem ou porquê. A minha equipa respondia que era uma ONG e todos nos viravam as costas desinteressados. Em todo o lado,os partidos construiram latrinas, fontanários, centros comunitários, e começaram a deslocar-se nos carros com música dentro e fora da cidade, como loucos e em festa pagando cervejas. Circular com carro tornou-se mais inseguro e as pessoas deixaram literalmente de trabalhar para "trabalhar" na campanha. Os ministérios estão parados, e qualquer assunto fica pendente por tempo indeterminado...Ao aproximar-se o dia da eleição toda a gente andava à procura do seu banho. Os meus colegas de trabalho, santomenses, começaram a aparecer com t-shirts, mochilas e canetas do partido, os quais proibi no local de trabalho. Depois perguntava se iam votar nesse partido e respondiam-me logo que não: "meu coração é do outro, mas se puder receber, recebo de todos". Basicamente, no dia das eleições, gerou-se um outro fenómeno, esse já não assisti pois não voto, que é o de "boca da urna" e que significa o banho após o voto. Várias pessoas me relataram o que sucede: a pessoa sai do l0cal de voto e logo uma pessoa a chama para lhe dar para a mão 200 mil dobras (que não chega a 10 euros) por votar no partido X e na esquina a seguir é chamada por um carro onde lhe dão uma quantia semelhante. Estava a almoçar na cidade, onde algumas pessoas de partidos também se encontravam, e assisti a outra situação normal. Entram duas senhoras que se dirigem a um senhor, que lhes pergunta se já foram votar, ao que lhe perguntam: "E meu banho?". O senhor diz-lhes para votarem primeiro no partido X, que depois irão receber "seu banho"... No dia seguinte, quando se souberam os resultados, no mercado da cidade estavam carros parados a distribuir dinheiro às pessoas que lá estavam. Eu desviei-me da rota, pois a confusão estava instalada. Isto chocou-me. Achei divertido outras facetas culturais da campanha a que não estou habituada. O que esperar de discursos políticos? Bom, nada de grandes debates e análises profundas da realidade politico-financeira do país... Assisti a um comício na TV que se passou numa comunidade, no qual o discurso enfático do líder para a população era o seguinte: "Se nós estivermos com uma mulher durante 35 anos e ela não parir, o que vocês fazem, vão ficar com ela mais 4 anos??" Ao que a população respondia com força: "Não!!!!!!!", e ele continuava:"Arranjavam outra mulher??" e a população respondia "Simmmm!!". Este é o resumo das últimas semanas e ao que parece a mulher vai mesmo mudar... Hoje perguntaram-me seriamente se não tinha ido votar. Eu respondi a sorrir que ainda recebi um saco de um partido com um chapeu de chuva, uma lanterna, uma caneta e um relógio...mas que não, por enquanto, continuo portuguesa. Rita

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Nocturno de chopin ( variações )

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Foto Net
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Era esta nota, folha diáfana de choupo, arrepiando ao de leve a superfície das águas do rio, que ouvi sibilina na noite cálida de ontem, olhando a lua cheia e a estrela da manhã, já sabendo que o vento não, nem suão, as árvores paradas, como estátuas, noites do sul, do alentejo serrano, nem vivalma, nas portas e poiais, isso era antigamente: - O astro tá parado, compadre! -Parece que mexeram as folhas agora... Vozes nos caminhos perdidos do tempo... A folha. dizia eu. a nota. com voz de céu. de música, entenda-se. Nocturna. De Chopin. Fez falta ontem neste clima de escorpião, de lacrau, para quem não saiba. Doçura de piano. Vestidos de cetim. Lábios de moça com peitos de regaço. Abraços. Na noite cálida, Chopin fez falta. Ontem à noite. No deserto. Sem tâmaras. .
Mértola, noite de Julho.
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"O tempo nas palavras"
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Texto já publicado por Pedro Martins, em 25/7, em http://aditaeobalde.blogspot.com, agora com ligeiras alterações.