sábado, 28 de maio de 2011

Tudo se transforma num deserto

Tudo se transforma num deserto
As casas com os postigos fechados
Debaixo do sol escaldante
Nem um rosto
Nem um ruído
É um momento de abandono
De solidão
Em que todas as pontes ruíram
E nem um vulto na distância
Na paisagem calada...
Estes momentos são aqueles
Em que nos medimos com o silêncio
Cujo rosto já não encontramos disponível!
Resta-nos ali ficar à espera
No vazio
Com saudades da sua voz...
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In "Os caminhos do silêncio " - a publicar
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Foto Net

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Antes da invenção das palavras!

Entrega-me o teu corpo de mistério luminoso
Que desvendo como peregrino
Nos caminhos solitários do mundo!
Com minhas mãos cheias de estrelas floridas de amor,
Que a todos reune
No Templo dos deuses sem nome,
Te amo,
E não firo convenções - que não tenho - :
Sou poeta, camponês, citadino, viajante, marinheiro,
Míscaro
Nascido do espérmen das estrelas,
Semente do céu,
Filho da Terra,
Escola sem livros,
Criança com o poder do Amor,
Dança livre do rosmano festivo,
Cobrindo os corpos juntos,
Sinfonia harmoniosa dos gestos,
As mãos entrelaçadas
No tempo sem tempo,
Antes da invenção das palavras!...
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In " Os caminhos do silêncio "
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Foto Net

domingo, 15 de maio de 2011

Palavras plenas

Palavras plenas,
só as da terra, do sol, e do mar,
e do choro, e do riso,
e da manhã, e da noite.
Sonho real, como as flores e os frutos,
e as sementes, e as folhas caídas e pisadas no chão,
e as mãos abertas com dedos com fome de amor e de vida sedentos,
só as palavras que cheirem a vida e a morte,
a lembrança e a esquecimento,
e a desejo de intemporalidade,
e saibam ouvir os búzios,
cujos segredos procuram escutar por entre as rochas e penhascos
nos caminhos que se confessam destinados ao amor infinito!.....
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Maio de 2011
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" Caminhos do silêncio"
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Foto Net
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Poema reconstruído

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Escreves azul sobre o branco ao lado do verde

Observas o voo perfumado do sonho sonhado na cadeira onde estiveste sentado, e cheiras o perfume do sonho, e revês-te sentado a sonhar ao lado das árvores ( distraído ao longo dos anos sem atentares na identidade da cadeira do sonho, só agora vês como é inócuo, infértil, amputado, embora sublime, o aroma que sobe no céu infinito e deixa confusas as estrelas debruçadas nas janelas do etéreo sobre as águas claras dos rios da terra, como que cheias de saudades das raízes, da frescura da terra, das mãos calosas que a trabalham, do cheiro do suor, do salgado da lágrima, da dança do riso, da liberdade festiva da aventura e da transgressão, da quentura dos corpos dos seres e da terra, ausências notadas nos incensos flutuantes evolando dos turíbulos movimentados por tuas mãos inaptas, impreparadas , inúteis…)…!!
Banhado pela luz do sol, e empurrado pela brisa, escreves azul em cima do branco do papel, sobre a mesa ao lado do verde das árvores floridas e com frutos…
Não resististe ao impulso conhecido em direcção às nascentes e aos regaços que sentes desde uma idade que não sabes localizar no mistério do tempo, e foste sentar-te ao lado do verde das árvores, e levaste a folha branca do papel, vazia como tu, vazio do verde, mas cheio dos cinzentos reflexos ecos ruídos guerras e conflitos, e imploraste pelo verde, o teu bosque de plenitude, brazonado em ti, mas situado muito para além da margem do teu rio de águas adormecidas, esquecidas, aparentemente abandonadas! …
Sentas-te então ao lado do verde, e começas por escrever: acariciado pela luz do sol, e assim permaneces, e vais mergulhando no colo da tua face não lembrada, até que já não te dás conta de que escreves, não a palavra: acariciado, mas sim inundado pela luz, e já não escreves que te sentes empurrado pela brisa = onda do mar, que te envolve e te alaga no verde das folhas, e deixas de falar em árvores floridas e em frutos: o teu olhar deixa de ser o teu olhar: dissolveu-se nos rios que sobem ao longo dos leitos frescos por dentro dos troncos das árvores e arbustos, fotossíntese tu és nos dedos esguios das gavinhas e nos sorrisos embriagados das folhas verdes balouçando no mar azul do céu que com um abraço infinito te recebe.
Dás contigo sem palavras que escrever. A caneta suspensa no sorriso da luz. O corpo aliviado da necessidade de pensar. Bote atrelado ao cais, reencontro dos seres e das fibras e das pedras e dos átomos do teu corpo com os átomos de todas as estrelas do universo. É o momento em que terminas o poema e olhas com outro olhar, e acaricias com outras mãos, as tuas, mas cheias de amor pleno, a mesa, e a cadeira, onde sentado escreveste a sonhar um poema sobre o sonho. - ( Os caminhos do silêncio )- Lisboa, Maio de 2011 - Foto Net