sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O Amor e os caminhos do silêncio

Algum dia saberemos o significado
E a finalidade dos encontros e desencontros
Enganos e desenganos
Acasos despedidas becos coincidências
Sincronismos descaminhos nos caminhos que
Juntos,
Desatentos,
Caminhamos?!...
Como poderemos saber como
Nasceu do nada a palavra cor de espanto?
Quem por nós falou?!
Quem por nós escreveu?!...
Quem por nós pintou?
Dizemos o quê nos recados de amor que semeamos
Sem dar conta nas estradas do silêncio?!
Com que lábios beijamos nos sonhos ( com ) que sonhamos?!...
Quem por nós sonha?!
Quem por nós zela?!
Quem vamos sendo por detrás das máscaras
Sombras corpos ( apenas corpos?!...e que corpos?! )
Dançando à luz da vela?
Desejaria bem sabê-lo...
Deslindarei um dia as linhas do novelo?!...
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In " As palavras são de água "
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Ealeixo
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Foto Google

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A poesia de Maria Azenha

1.
Esta é a página onde o poema não se deu
onde o alfabeto e a tinta se encontram
onde não há nenhum poeta nem acontece o som
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as vogais voam sem produzirem eco
abrem o céu através do espaço oco
uma nuvem tão terna um espelho tão doce
as crianças celebram-no esquecendo o seu nome
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( Primeira folha da inteligência dos bosques )
« O homem só muito lentamente
aprende o seu nome» - Guilherme de Occum
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2.
Não escrevas a palavra pedra se não tens à mão
uma pedra
não digas a palavra água se nunca quiseste morrer
não penses a palavra flama se o coração não arder
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guarda vagarosamente cada som
silenciosamente trabalha o desenho de cada letra
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a um poeta é reservado
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o alfabeto
uma árvore
o fogo
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3.
Três barcos seguem o luar do bosque
o luar segue os três barcos
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o rio
puro como a seda
é um caminho
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não procura haste
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reflecte
com seu olho límpido
o vazio
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( Segunda folha da ciência dos bosques )
« Não sejas o de hoje.
Não suspires por ontens...
Não queiras ser o de amanhã.
Faz-te sem limites no tempo.
Vê a tua vida em todas as origens.
Em todas as existências.
Em todas as mortes.
E sabe que serás assim para sempre.
Não queiras marcar a tua passagem.
Ela prossegue:
É a passagem que se continua.
É a tua eternidade.
És tu.»
Cecília Meireles
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4.
No lago mais profundo repousa a jóia do bosque.
é esta a última palavra.
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( Quinta folha do coração dos bosques )
« Perdi o medo de mim. Adeus.»
Adélia Prado
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In " de amor ardem os bosques" , de Maria Azenha
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Com um abraço meu, dizendo-lhe que gostei muito da sua poesia.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Sobre a dor

que escrita fica
do espaço
e tempo
da dor
não dita?
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In " As palavras são de água "-
Ealeixo
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Lembrando o sofrimento no Haiti e na ilha da Madeira
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Foto Google

sábado, 20 de fevereiro de 2010

É então que recebemos as asas

O ser na consciência do ser
deixa de ser o mesmo ser
é outro olhar com os mesmos olhos
outro sentir com o mesmo corpo
outro amar com o mesmo coração
outro pensar com o mesmo cérebro!
É então que recebemos as asas
e choramos no desejo de cantarmos
lavando as mágoas...
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Lx, 18 /2 / 2010
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Os caminhos do silêncio
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( Foto minha )

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Minha génese

Foste, és e serás sempre a minha paixão
Mulher guerreira, em vias de extinção
Nunca na vida conheci ninguém igual
És a génese de tudo o que agora sou
Foste a mestra que sempre me ensinou
Contigo aprendi a ser alguém especial
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Foram muitas as agruras que a vida deu
Não cedestes, teu ânimo não esmoreceu
Ainda hoje vais à luta, não viras a cara
Nunca vi no teu rosto sinal de teres medo
Se algum dia tiveste, guardaste segredo
És tenaz, lutadora e todo o mundo repara
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Jamais ouvi da tua boca um queixume
És combustão, labareda de outro lume
Sempre pronta para a tristeza combater
Com esse olhar cheio de determinação
Estiveste sempre disposta a dar a mão
És amor, que melhor mãe poderia ter.
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In " Amador do Verso " - de Emanuel Lomelino
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NOTA: Publico com todo o gosto este poema do meu amigo Manu, ( http://amadordoverso.blogs.sapo.pt ) dedicado à sua mãe, e que ele leu na apresentação do seu livro. Gostei muito de ter estado presente. Gostei também muito do prefácio escrito pela Ausenda Hilário ( Utopia das Palavras - http://poemas76.blogs.sapo.pt ). Parabéns, amigo. Toda a sorte do mundo para ti e tua obra. Parabéns, Ausenda. Um abraço aos dois. Eduardo Aleixo

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

OVO

sou ovo.
que parto.
e nasço.
de novo!
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Ealeixo
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Os caminhos do silêncio
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Lx, Fev/2010

domingo, 14 de fevereiro de 2010

OS MEUS AMIGOS

Amigos cento e dez e talvez mais,
Eu já contei! vaidades que eu sentia!
Pensei que sobre a terra não havia
Mais ditoso mortal entre os mortais.
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Amigos cento e dez, tão serviçais,
Tão zelosos das leis da cortesia,
Que eu já farto de os ver, me escapulia
Às suas curvaturas vertebrais.
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Um dia adoeci profundamente,
Ceguei.Dos cento e dez houve um somente
Que não desfez os laços quase rotos.
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Que vamos nós ( diziam ) lá fazer,
Se ele está cego, não nos pode ver...
Que cento e nove impávidos marotos.
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Camilo Castelo Branco
( Parceria com o blogue http://noitesdeinsonias.blogspot.com )

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Pontos tricotados

É como se as palavras chegassem,
não para serem lidas ou faladas:
recados de búzios alados,
pontos tricotados
nos caminhos encruzilhados
do destino,
a serem, no devido tempo,
decifrados...
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Lisboa, Fev. 2010
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Os caminhos do silêncio
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Ealeixo
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Foto Google

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Convidada de Fevereiro: Marguerite Yourcenar

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Foto Google

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CECCHINO DEI BRACCHI

" Eu, Miguel Ângelo, entalhador de pedra, desenhei nesta abóbada a imagem de um jovem de Florença que eu amava e que não existe mais. Ele está sentado numa atitude hostil e os seus braços dobrados parece esconderem o seu coração. Mas os mortos têm talvez um segredo que não querem que nós conheçamos.
Amei em primeiro lugar os meus sonhos porque não conhecia outra coisa. Depois amei a minha família ( que era, parece-me agora, como se me amasse a mim mesmo ) e os amigos que vinham a mim carregados de tanta beleza que eu me sentia ao mesmo tempo humilhado e feliz. Por fim amei uma mulher. Os meus pais morreram. Os meus amigos, os meus amados partiram: uns deixaram-me para viver, outros traíram-me com a sepultura. Dos que restam, eu duvido; mesmo que as minhas suspeitas sejam injustas, sofro tanto como se o não fossem porque é no nosso espírito que tudo se passa. A mulher que amei também se foi deste mundo como uma estrangeira que se dá conta de que se enganou na porta e de que a sua casa é noutro sítio. Então pus-me de novo a amar os meus sonhos porque não me restava mais nada. Mas os sonhos também podem trair e agora eu estou só.
Amamos porque não somos capazes de suportar estar sós. E é pela mesma razão que temos medo da morte. Quando por vezes disse em voz alta que gostava de alguém, via à minha volta piscadelas de olho e meneios de cabeça como se aqueles que me ouviam se julgassem meus cúmplices ou se sentissem com direito a serem meus juízes. Os que não vos acusam procuram desculpar-vos e isso é pior ainda. Por exemplo, uma vez amei uma mulher. Quando falo só de uma mulher não estou a falar nas outras, as passantes que não são mulheres, mas sim a mulher e a carne. Amei uma só mulher, que não desejei, e quando penso nisso ainda não sei se era por ela não ser suficientemente bonita ou por sê-lo de mais. Mas as pessoas não compreendem que a beleza possa ser um obstáculo que aplaca o desejo antes de ele nascer. Esses mesmos que nós amamos não o compreendem ou não querem compreendê-lo. Espantam-se, sofrem, resignam-se. Depois morrem. Então começamos a temer que a nossa renúncia tenha pecado contra nós mesmos, e o nosso desejo, agora sem saída, tornado irreal e obsessivo como um fantasma, torna-se monstruoso como tudo aquilo que não chegou a ser. De todos os remorsos do homem, o mais cruel é aquilo que ficou por realizar.

Amar alguém não é simplesmente querer que ele viva, é também espantar-se que ele deixe de viver, como se morrer não fosse natural. E no entanto, ser é um milagre mais surpreendente do que não ser; é diante daqueles que vivem que deveríamos ajoelhar como diante de um altar. Imagino que a natureza se cansa de resistir ao nada, como o homem de resistir às solicitações do caos. Na minha existência, mergulhada, à medida que avanço em anos, em períodos cada vez mais crepusculares, vi repetidamente formas de vida perfeita darem lugar a outras mais perto da humildade primitiva, tal e qual como a lama é mais antiga que o granito; e aquele que talha as estátuas não faz mais, no fundo, do que apressar o esboroamento da montanha. O bronze da sepultura do meu pai enche-se de verdete num cemitério de aldeia, a imagem do jovem de Florença há-de começar a escamar-se nas abóbadas que pintei, os poemas que fiz à mulher que amei não serão compreendidos dentro de poucos anos, e essa é uma maneira de os poemas morrerem. Querer imobilizar a vida é a danação de escultor. É talvez nesse sentido que toda a minha obra é contra a natureza. O mármore em que julgamos fixar uma forma efémera de vida retoma a cada instante o seu lugar na natureza, pela erosão, pela pátina, pelos jogos de luz e de sombra em planos que pareciam abstractos mas que são afinal a superfície de uma pedra. Assim, a eterna mobilidade do universo suscita sem dúvida a admiração ou o espanto do Criador.
Beijei, antes que a pusessem no caixão, a mão da única mulher que para mim dava sentido à vida toda, mas não beijei os seus lábios, e agora tenho pena, como se eles tivessem podido ensinar-me qualquer coisa. Também não beijei o jovem de Florença, nem as suas mãos, nem o seu rosto claro. Mas esse não o lamento, era demasiado belo. Era perfeito como aqueles que nada pode atingir, pois os mortos são todos impassíveis. Vi muitos mortos. O meu pai, retornado à sua raça, não era mais do que um Buonarroti anónimo: libertara-se do fardo de ser ele; na humildade da morte, ele apagava-se até ao ponto de ser apenas um nome numa longa série de homens; a sua linhagem não desaguava já nele mas em mim, seu sucessor, pois os mortos são só os termos de um problema que se põe, de cada vez, a cada um dos seus continuadores vivos. A mulher que amei, no fim da agonia que a sacudiu como para arrancar-lhe a alma, ficou com um duro e triunfante sorriso a pairar como se, vitoriosa da vida, desprezasse em silêncio a sua adversária vencida, e eu pude ver nela o orgulho de ter ultrapassado a morte. Cecchino dei Bracchi, meu amigo, era simplesmente belo. A sua beleza, que se parcelara em vida em tantos gestos e pensamentos, feitos expressão ou movimento, voltava a ser intacta, absoluta, eterna: parecia que ele tinha composto o corpo antes de o deixar. Vi sorrisos dar cor a lábios exangues, filtrar sob pálpebras cerradas e iluminar tantos rostos. Os mortos repousam satisfeitos numa certeza que nada pode destruir porque é ela que se anula à medida que se cumpre. E porque eles tinham passado além da ciência, eu supus que eles sabiam.
Mas talvez os mortos não saibam que sabem." - In " O TEMPO esse grande escultor " - de Marguerite Yourcenar

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Isto é mais importante

É importante escutar o que dizem os pássaros,
a voz do mar,
os sentimentos do vento,
a sonata do luar,
o namoro das pedras com as águas,
a sinfonia dos canaviais,
o rumorejar dos pássaros
antes do anoitar dos bicos
debaixo dos sovacos das penas...
Tantas palavras que escrevo para dizer
que isto é mais importante
do que os pensamentos ardilosos
que te povoam a mente
e com os quais, se dizes que sentes
a sábia música do silêncio...
mentes!....
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Ealeixo
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Os caminhos do silêncio
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Lisboa, Fev, 2010
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Foto blogue tiraada no Ilheu das Rolas - S. Tome e Príncipe, em Junho de 2008

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Entre dois mundos

Se não me surge a mensagem
na leveza da postura
do Ser,
procuro nas grutas da terra e do mar,
sem medo dos silvos
e das sombras
e das asas na penumbra,
os caminhos da luz,
o azul do céu e o azul das ondas,
sobre as quais outros barcos navegam
e outras músicas se levantam,
libertas asas me acenam,
corpos leves de risos
e de cantos
cantados por bocas
iguais à minha,
mas sem amargura nos lábios !...
Como é possível
ser o mesmo, o mar,
apenas (!) diferente, o olhar,
o respirar,
o andar,
o voar,
que deixa de o ser,
quando me ponho
para as asas
- estupidamente -
a...pensar !!
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Lisboa, 28/01/2010
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Os caminhos do silêncio
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Foto tirada no ilhéu das Rolas, em S.Tomé e Príncipe,
em Junho de 2008
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Ealeixo.