terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Até ao Novo Ano

Esta será a minha última postagem deste final de ano de 2009 em São Tomé. Vou dedicá-la ao último passeio que fiz, rumo a uma zona isolada e apenas acessível via mar, chamada São Miguel, vila outrora habitada. Para lá chegar fomos de carro da cidade até Santa Catarina, a povoação onde acaba a estrada. Aí, combinámos com um pescador, para nos levar de canoa até São Miguel, pagando-lhes nós o combustivel do pequeno barco. Não sabia eu que a viagem iria demorar quase duas horas para ir e mais outras duas para regressar... Mas assim foi. Sob o sol bem quente e uma paisagem magnífica junto à costa, rumámos pelo mar, cada vez mais longe, onde só os pescadores e vinhanteiros vão...São Miguel. Lá, numa enseada tropical, estão construidas pequenas barracas de madeira junto à praia, onde ainda vivem isolados do mundo uma mulher e sua filha, mais uns vinhanteiros - homens que apanham o vinho da palma - que por lá ficam temporariamente alguns meses e vão vender o vinho a Santa Catarina. Apenas uma vez por ano, em Setembro, aquela zona se volta a encher de gente, que numa rumaria da festa de São Miguel passam lá o dia, onde é celebrada uma missa na pequena capela que ainda por lá permanece. Mal chagámos, começamos a subir a encosta onde nos disseram que há muita cobra preta, rumo à capela que estava escondida no meio da vegetação. Capela essa que nada mais é que outro pequeno casebre a cair, mas com a imagem do santo no interior onde ainda muita gente vem pagar promessas. Pelo caminho ainda falámos um pouco com 3 rapazes vinhanteiros que nos perguntaram pelo resultado do jogo de futebol entre o Benfica e o Porto... Como não tinhamos tido energia na noite anterior não lhes pudemos responder, apesar de lhes ter dito que provavelmete ganhara o Benfica, ao qual um dos rapazes ficou todo contente :) Para meu espanto, nessa noite em casa, percebi que o jogo de futebol ainda não tinha acontecido, era nessa mesma noite! No entanto, não me enganei no resultado...! Ainda pelo passeio, andámos pela praia e conhecemos as senhoras que lá vivem sozinhas, um cão e algumas galinhas. Pensei no que seria lá passar uns dias sem nada de nada... Final da história e reencontramo-nos em 2010! Beijos e saudades, Rita

segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Que o novo ano seja NOVO!

Aprendizagem permanente. As desilusões - sempre, ainda! - no desboroar das aparências. Tantas maldades cândida e principescamente enroladas em embrulhos de pequenos, quantas vezes, imperceptíveis gestos, insinuações, silêncios, chantagens , traições...Tanta inflação de palavras nobres no fim das quais ficamos atónitos no palco vazio, ou na rua cheia de pessoas apressadas, que procuram apenas que olhem para elas, que as mimoseiem, mas que se desviam do corpo pedinte, e do olhar suplicante: podia estar morto ali na avenida, à hora de ponta, quantos o levantariam e perguntariam: quem é? quem foi? ...Na hora da verdade, da dor ou da alegria, quantos amigos de palavras tão belas, tão amigos, com versos retóricos de flores e de mar, aparecem ao teu lado e em silêncio te olham sorrindo sem se rirem, pondo uma rosa na lapela do teu coração?! Nada de novo. Aprendizagem permanente. Há apenas que ver se errámos menos, se lavamos mais facilmente as mágoas, se perdoamos com mais facilidade...mas se ...jogamos fora, como lixo, certas palavras e certos caminhos... Que o novo ano seja um ano NOVO... Eduardo Aleixo

sábado, 26 de dezembro de 2009

Falo da semente da fala

Cada som da palavra seja gota
Do sangue que a fala,
Sem ela não viva
Como barco sem vela
Como ar
Se nos faltasse.
Fala, canta, dança, pinta, cala,
Mas como se morresses
Em cada fala
Em cada canto
Em cada dança
Em cada tela
Em cada respiro de silêncio!
O resto...está a mais,
Nem máscara é!
Tão longe do ar,
Da água,
Do perfume,
Do incenso...
Ouve:
Até do suor está longe
E do sexo
E do amplexo da pele
Que até os anjos podem invejar!
Falo da semente da fala
Da fonte
Onde todos ajoelham
E com sede
Nem falam!
-
Eduardo Aleixo
-
( Os caminhos do silêncio )
- ( Obrigado, Frutuosa Santos, pela foto )

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Mensagem de Natal

ABRAÇOS.

Eduardo Aleixo

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

NATAL

( Foto, S. Tomé e Príncipe )
POEMA
-
Simples como os homens do campo.
Bonito como os chalés da cidade.
Carregado com sonhos de amor, de justiça e de beleza,
O poema cresce universal.
O poema dança
Sem cobrar bilhetes
Em cima de todos os continentes.
O poema é o sol que brilha em todos os corações,
Por que clamam todos os Invernos
Quando a Primavera se banqueteia
Em noivado de sorrisos
No regaço dos goiveiros.
O poema rosto triste das crianças
Nas cinturas das cidades
Onde o Natal chega...
Mas não encontra empregos
Para a compra de casas, de comida,
De roupa e de brinquedos!...
-
Eduardo Aleixo
-
In " As palavras são de água "

sábado, 19 de dezembro de 2009

Poema de Natal

Natal de quem?

-

Mulheres atarefadas

Tratam do bacalhau,

Do perú, das rabanadas.

-

- Não esqueças o colorau,

O azeite e o bolo-rei!

-

- Está bem, eu sei!

-

- E as garrafas de vinho?

-

- Já vão a caminho!

-

- Oh, mãe, estou pra ver

Que prendas vou ter.

Que prendas terei?

-

- Não sei, não sei...

-

Num qualquer lado,

Esquecido, abandonado,

O Deus-Menino

Murmura baixinho:

- Então e Eu,

Toda a gente Me esqueceu?

Senta-se a família

À volta da mesa.

Não há sinal da cruz.

Nem oração ou reza.

Tilintam copos e talheres.

Crianças, homens e mulheres

Em eufórico ambiente.

Lá fora tão frio,

Cá dentro tão quente!

-

Algures esquecido

Ouve-se Jesus dorido:

- Então e Eu,

Toda a gente Me esqueceu?

-

Rasgam-se embrulhos,

Admiram-se as prendas,

Aumentam os barulhos

Com mais oferendas.

Amontoam-se sacos e papeis

Sem regras nem leis.

E Cristo Menino

A fazer beicinho:

- Então e Eu,

Toda a gente Me esqueceu?

-

O sono está a chegar.

Tantos restos por mesa e chão!

Cada um vai transportar

Bem-estar no coração.

A noite vai terminar.

E o Menino, quase a chorar:

- Então e Eu,

Toda a gente me esqueceu?

Foi a festa do Meu Natal

E, do princípio ao fim,

Quem se lembrou de Mim?

Não tive tecto nem afecto!

-

Em tudo, tudo, eu medito

E pergunto no fechar da luz:

- Foi este o Natal de Jesus?!!!

-

Poema de João Coelho dos Santos, in: " Lágrima do Mar - 1996 - O mais belo poema de Natal

-

O poema foi-me enviado pela minha querida amiga, Frutuosa dos Santos, a quem agradeço.

-

As fotos são do Google.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Bote confiante no mar misterioso...

O que faz mover a tua mão? ! -
Que sabedoria existe
Para além do que te ensinaram
Ser o pensamento?!
-
Que parte de ti sente
Ser maior do que alguma vez
Terias capacidade de imaginar
Se tivesses essa capacidade?!
-
Como podes ignorar a força
Estranhamente poderosa
Que te move
E te faz bote confiante no mar misterioso
Com vagas alterosas,
Onde buscas
E sempre encontras,
Deslumbrado,
As palavras luminosas?...
-
Eduardo Aleixo
-
Os caminhos do silêncio
-
Foto Google

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

A poesia de Isabel Mendes Ferreira ao som imaginado das teclas do seu ...PIANO (1)

- 1. O fermento e o chão ------------- em cada dezembro

------------------ pediste-me uma asa. dei

o coração. fora de qualquer tempo

ou temática sem enredos nem

poços nem geografias digitais. apenas

o fermento dos dias submersos, indissonantes

e caminheiros, uma

terra e um céu, duas asas e toda

a sementeira. e mesmo que as ervas

nos sejam avessas nada

muda, ungir a corrente dos dias

é o que faço, em silêncio, que te

solto no amargo e no doce, como

o mais intemporal dos fermentos.

-

vegetal e aéreo este dezembro de asa, osso e coração.

---------

2. momentos de pluma------------e de lume

momento errático

-

----------- é neste momento sem hora explícita que me faço transição, de nenhum lugar

para nenhum outro. apenas fogo e jogo. jogo de desencontros singulares. solidão do

"ante-mundo" sem marés nem luas nem vales. nem estepes. esfera. espera. in.rolante

espaço desimportante de onde me transito----------- eremita das horas. simbiose das mãos

descritivas e extremas, um momento branco. intransitável. irrisório e convexo. não me

digas que estou ilegível, sou. estampa aguda de heresias. uma carta sem rodeios nem

apelos. incerto o instante que desacerto neste aperto. alquímico. a realidade tem o

preço gasto. consumido pelo excesso. excesso-me rente ao chão. lá fora só existe tempo.

e cego. cego este tempo. não me entendes.

dizes. nem

eu ------------este dezembro é um fio. intermitente. extinto coral onde me sou vulto.

re.fragmento-me

-

Isabel Mendes Ferreira

( Fotos tiradas em S. Tomé e Príncipe )

-

(1) http://mendesferreira.blogspot.com

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Porque... chegou o tempo!

(Foto de Lucy, que agradeço: http://lucy-natureza.blogspot.com )
-
Não é porque seja noite
Ou a chuva caia!
Podia ser de dia
Com o sol rutilante a causticar o chão de pedra.
Mas o que tem de acontecer
Acontece seja qual for o tempo
E o momento!
Acontece como se fosse uma carta atirada
Pelas mãos do vento!
E então,
Quando o vento passa,
Como um cavalo a galope
E este se afasta,
É no silêncio que fica
Que os olhos... olham,
A atenção... atenta,
A memória... lembra os pequeníssimos detalhes
Como fios de teias
Urdidas nos labirintos e nos becos do tempo...
E faz-se luz!
Completamente!
Mesmo que seja noite e faça vento...
Porque... chegou o tempo!
-
25/11/2oo9
( Os caminhos do silêncio )

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Apresentação de "As palavras são de àgua" na Feira do Livro, em Mértola.

Os elementos da autarquia, ao centro ( Mário e Sandra ); e o Pedro - que me apresentou - e eu, nos extremos.
Imagens do público amigo presente.
Lendo alguns poemas, com destaque para um, referente ao que sinto quando, passados estes anos , vou à minha terra...
-
O significado das raízes
Só os cerros recortados contra o céu
Parecem os mesmos da minha infância!
Já as águas do rio, no vale, não são transparentes como eram.
Há peixes que desapareceram
E não sobem nas águas de Março.
Nos postigos fechados da vila antiga,
Alcandorada na encosta íngreme,
Assoma o rosto do silêncio.
O que vejo, mas não conheço,
São os filhos e netos da minha geração de amigos,
Alguns já mortos.
O que significa que o tempo foi correndo,
A poluição conspurcou as águas
E fui envelhecendo.
Hoje, sou um estrangeiro no cenário em que fui, como actor,
Um sonhador dinâmico,
Mas onde sinto que só as raízes das árvores escutam o meu canto!
Olho para elas com outros olhos
E compreendo melhor o significado das raízes!
-
Eduardo Aleixo ------------- Mértola, 21 de Novembro de 2009

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Convidado deste mês: Manuel da Fonseca

1. Sol do mendigo
( Foto de Lucy, a quem muito agradeço )
-
Olha o vagabundo que nada tem
e leva o Sol na algibeira!
Quando a noite vem
pendura o Sol na beira dum valado
e dorme toda a noite à soalheira...
Pela manhã acorda tonto de luz.
Vai ao povoado
e grita:
- Quem me roubou o Sol que vai tão alto?
E uns senhores muito sérios
rosnam:
- Que grande bebedeira!
-
E só à noite se cala o pobre.
Atira-se para o lado,
dorme,dorme...
-
2. Serenata
-
Meninas casadoiras que mostrais as prendas, da janela,
fechai a janela quando eu passar
que eu só trago amor para vos dar.
E mais que amor
só as minhas histórias de vagabundo
e o meu desejo de ir embora pelo mundo...
...a vida é tão pouca
e o mundo é tão grande
que terra aonde eu passe não posso voltar.
Meninas casadoiras,
uma de vós, esta noite,
esqueça tudo que lhe ensinaram,
abandone o bordado e o estudo do piano
e seja mulher, simplesmente mulher.
Então ninguém mais do que eu terá tesouros para vos dar!
Mas se de vós todas, nenhuma quiser,
ó meninas casadoiras que mostrais as prendas, de janela,
fechai a janela quando eu passar...
-
3. Aldeia
-
Nove casas
duas ruas,
ao meio das ruas
um largo,
ao meio do largo
um poço de água fria.
-
Tudo isto tão parado
e o céu tão baixo
que quando alguém grita para longe
um nome familiar
se assustam pombos bravos
e acordam ecos no descampado.
-
4. Estradas
-
Não era noite nem dia.
Eram campos, campos, campos
abertos num sonho quieto.
Eram cabeços redondos
de estevas adormecidas.
E barrancos entre encostas
cheios de azul e silêncio.
Silêncio que se derrama
pela terra escalavrada
e chega no horizonte
suando nuvens de sangue.
Era a hora do poente.
Quase noite e quase dia.
-
E nos campos, campos, campos
abertos num sono quieto
sequer os passos de Nena
na branca estrada se ouviam.
Passavam árvores serenas,
nem as ramagens mexiam,
e Nena, pra lá do morro,
na curva desaparecia.
Já da noite que avançava
os longes escureciam.
Já estranhos rumores de folhas
entre as esteveiras andavam,
quando, saindo um atalho,
veio à estrada um vulto esguio.
Tremeram os seios de Nena
sob o corpete justinho.
E uma oliveira amarela
debruçou-se da encosta
com os cabelos caídos!
Não era ladrão de estradas,
nem caminheiro pedinte,
nem nenhum maltês errante.
Era António Valmorim
que estava na sua frente.
-
Nena de Montes Velhos,
se te quisessem matar
quem te havera de acudir?
-
Sob o corpete justinho
uniram-se os seios de Nena.
-
- Vai-te António Valmorim.
Não tenho medo da morte,
só tenho medo de ti.
-
Mas já a noite fechava
a saída dos caminhos.
Já do corpete bordado
os seios de Nena saíam
- como duas flores abertas
por escuras mãos amparadas!
Ai que perfume se eleva
do campo de rosmaninho!
Ai como a boca de Nena
se entreabre, fria, fria!
Caíu-lhe da mão o saco
junto ao atalho das silvas
e sobre a sua cabeça
o céu de estrelas se abriu!
-
Ao longe subiu a Lua
como um Sol inda menino
passeando na charneca...
Caminhos iluminados
eram fios correndo cerros.
Era um grito agudo e alto
que uma estrela cintilou.
Eram cabeços redondos
de estevas surpreendidas.
Eram campos, campos, campos
abertos de espanto e sonho...
-
Manuel da Fonseca
( In Obra completa, Obra Poética )