sexta-feira, 28 de maio de 2010

Irmão das estrelas

Moro debaixo do céu
E falo com as pedras
Sou filho da terra
Mas irmão das estrelas
Procuro nas grutas os caminhos da luz
E nas rochas húmidas oiço o barulho do mar
No outro lado de mim...
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" os caminhos do silêncio"
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Santa Cruz, Maio de 2010
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Foto Google

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Poeta convidado: Gastão Cruz

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1. GLENN GOULD
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Depois de sete anos recolheu-se
à comedida sombra dos estúdios;
não queria exceder o som exacto
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que devia criar, o seu volume:
só assim pronunciaria
convictamente, sobre o que saía
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das teclas percutidas,
como se já cantasse, soltas sílabas;
exemplo para poetas poderia
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ser o deste pianista ao recusar-se
a forçar o seu som até que enchesse
enormes salas ( ele próprio o disse):
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os grandes artesãos sempre algo ensinam
ao verso como outrora manolete
a joão cabral de melo neto
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2. ALGUNS PIANISTAS
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Emil Gilels tocava
como se detivesse fogo ou água:
em torno dele a luz formava um laço
de ouro líquido jorrando do teclado
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A cabeça potente assemelhava-se
à do autor do som que se expandia
como de ouro fundido um
largo rio
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Sviatoslav Richter imitava
o rigor da poesia ou da leitura
que dela fazem os que lêem nela
do universo a explosão futura:
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em cada nota morre o universo
tal como em cada sílaba
da poesia, por isso ele tocava
em sala escura
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e uma pequena luz mostrava a pauta
somente, para que não se perdesse
nenhum quinto de som, sua vogal,
e, ele e o público, nada os distraísse
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Arturo Benedetti Michelangeli
vinha segundo a lenda acompanhado
de dois pianos e não agradecia
aplausos: só a música
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e os autores dela deveriam
merecer o aplauso que era a escuta
apenas, uma arte tão difícil
e rara de que tanto necessita
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também a poesia; a perfeição
parecia o limite inatingível,
por vezes atingível mito fixo
num céu longínquo como a arqutípica
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imagem do pianista, este ou outro
dos que cantei ou já cantara quando
os vira como exemplos do domínio
dos braços e da mente sobre o rio,
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em vertigem,
do som feito sentido,
assim sobre o teclado as evidentes
mãos de Horowitz
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3. OFÍCIO
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Os poemas que não fiz não os fiz porque estava
dando ao meu corpo aquela espécie de alma
que não pôde a poesia nunca dar-lhe
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Os poemas que fiz só os fiz porque estava
pedindo ao corpo aquela espécie de alma
que somente a poesia pode dar-lhe
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Assim devolve o corpo a poesia que se confunde com o duro sopro
de quem está vivo e às vezes não respira
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Gastão Cruz
In, " ESCARPAS"

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Música no silêncio

Música no silêncio antiquíssimo da noite!
Eterno o silêncio, eterna a música,
Que sempre existiram no universo,
Nas águas e no vento!
Aqueles que a escutaram antes dos outros
Foram os que nasceram compositores!...
Ouço-os no silêncio da noite
Cada vez mais atento
Quando cansado estou dos ruídos periféricos
Da vida. Da vida que corre sublime
E pura como as águas limpas que se ouvem correr
Livres nas montanhas.
Música pura, é o silêncio, que fala.
E quando fala e eu escuto,
Respiro, pairo, danço, voo,
E entro no universo infinito do meu corpo
Que se transforma sem dar por isso
Num oásis de conforto!...
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In " As palavras são de água "

...simplesmente...

leva-se... muito tempo... a aprender
a ...simplesmente ... olhar... e ver!
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Lx, Maio 2010
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Foto de Frutuosa Santos
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" Os caminhos do silêncio"

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Tantas sovas levei por causa das galinhas!

Em criança indo para a escola
Numa manhã qualquer
A pensar que podia mudar a posição
Das galinhas e dos pintainhos todos juntinhos
Comendo os farelos colocados num prato de barro na rua por onde passava...
Lembro-me da alegria de passar
Junto das galinhas e dos pintainhos
e de pegar pelos rabos das galinhas
Uma em cada mão
E de levá-las comigo
Cocorococó...cocorococó...
Que barulho de asas e de penas
E eu sentindo que era alguém
Importante
Tinha mudado a realidade
Tinha criado outro cenário
Tudo de facto mudou
A dona das galinhas saiu esbaforida de casa
Gritou
Malandro
Sem educação
Hei-de dizer à tua mãe
Velhaco
É isso que te ensinam na escola?!
E eu com medo...
Fui aprendendo o medo...
Percebi também a razão da dona das galinhas...
Mas a minha razão era a minha razão
E era mais forte do que eu!
Sabia que ela iria fazer queixas à minha mãe:
« Vizinha, veja bem o seu filho,
Não leve a mal,
Mas que mal lhe fazem as galinhas?! »
Tantas sovas levei por causa das galinhas!...
Tantas vezes ouvi que era maluco
Por causa de pegar nas galinhas pelo rabo!
E nunca ninguém percebeu
A felicidade que havia em mim
Só por alterar o cenário da rua por onde passava
Puxando o rabo das galinhas!...
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As palavras no tempo...
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Lx, Maio/2010
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Foto Google

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Não há lágrimas mais puras!

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Tudo fica em mim
Pedra me edifica
Flor
Nervura de folha
Desenhos gravados nas conchas
Músicas legadas aos corações dos búzios
Dores, mágoas, promessas não cumpridas,
Desejos não satisfeitos,
Encruzilhadas, becos,
Bosques inventados em caleidoscópios de magia
Mas que o sol cru de uma manhã
Ou o vento agreste de uma noite
Ou as circunstâncias que a poesia não descreve
Bolinhas de sabão embatem contra as rochas...
Mas tudo fica no coração do poema
Atordoado
Sublimado
Sublime
Doce amado poema
Do amor mais puro que há
Perfume que as almas cheiram
Em cálices de suavidade sorridente
Bálsamo de perdão
Não verbalizado:
Não há culpas
Face aos enigmas poderosos
Que atravessam as nossas vidas!
Perante elas me inclino enternecido
No labirinto
Dos versos
Gravados nas paredes das grutas
Por onde passo alado
E digo:
- Não há lágrimas mais puras
Mesmo com resíduos de mágoas
Nem sorrisos mais cristalinos
Nem silêncios mais carinhosos
Do que estes que ouço
À medida que vou escrevendo o meu poema...
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Os caminhos do silêncio
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Lx, 20/04/2010
Foto Google

terça-feira, 4 de maio de 2010

Poema de Água do Mar

1º andamento: a música
- Vivace
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Dedilhas a viola docemente
e o teu sorriso incita-me a dançar...
Desfaço a minha trança lentamente,
o meu corpo volteia em teu redor.
O meu lenço, pássaro perfeito,
voa de mim para ti,
de ti para mim...
Baila-me o sangue ao ver como me olhas
e as tuas mãos frenéticas
tiram das cordas sons roucos de paixão.
Na minha dança os dedos falam de amor
e a cada volta que dou
mais me queima o teu olhar
mais me esquivo e mais me ofereço
mais te dás e te pertenço.
...e pões de parte a viola
e vens prender-te ao meu lenço.
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Poema enviado por Água do Mar

sábado, 1 de maio de 2010

Chove, chuva...

Chove. E é importante que chova!
A chuva embala
o silêncio da chuva
que molha as palavras
entre a alegria e as mágoas.
Alaga as estradas da memória.
Irrompe pela clareira do presente.
E invade os caminhos do futuro que não sei.
Tudo isto agora
em que as palavras querem água
e não deixam de sonhar com o mar da alegria,
que digo eu, com o infinito da plenitude,
da serenidade,
do navegar imensamente calmo
e firme
nas ondas azuis e verdes e vermelhas
da liberdade!
Chove, chuva,
irmã do sol e da luz
que afasta as brumas,
mas sem elas, como saborear
a candura e a transparência do céu que não engana?
Chove na noite,
e à medida que as palavras são molhadas
vai-se fazendo luz,
como se fosse a chegada paulatina
da madrugada!...
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Lisboa, 17 - 18 de Abril de 2010
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Os caminhos do silêncio
Foto google