quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

É do amor que falo

A dádiva total dos corpos às águas
Que desabam das montanhas.
A vitória dos peixes sobre as pedras.
O riso do sol face ao espanto
Do corvo hierático sobre as rochas.
Canto a placidez das cegonhas
Sobre as calmas enseadas,
O rumorejar dos barcos,
O farfalhar dos choupos,
A correria infantil dos cães
Sobre as areias inclinadas dos rios.
É do amor que falo.
Do riso contra a bruma.
Do teu corpo liberto
Dançando violento sobre o verde
Onde os insectos enlouquecidos
Incomodam a casa que arde
Nas veias do centro da terra descoberta.
Beijo líquido e resinoso à sombra do mês de Abril
Que aspira o aroma do rosmano, das estevas e
Das urzes,
Nudez agreste e calma.
Canto contra a morte
Que nem lembro.
Renasço, pleno, babado de raízes.
Admiro o céu,
As águas sobre o corpo.
Ainda há pouco chorava como um ramo
Em orvalho de manhã
O sonho de ser água.
Criança sem mais nada que o riso numa taça.
A eloquente solidão,
A festa que dança com teu corpo nu e vitorioso
Sobre as dunas...
Quão difícil foi chegarmos à dança com que
Danças,
Sem tempo sobre o tempo!
Difícil, sim, difícil, foi crescermos e nascermos
Para o riso
E para a espuma
Espantada com a leveza das palavras
E o regresso ao vento aberto,
Às ânsias do sol-posto,
Aos dedos,
Loucos de inocência,
Descobrindo as grutas sobre a pele.
A noite já chegou
E eu não tenho mais palavras, meu amor,
Senão conchas em repouso sobre as rosas do
Regresso.
Ajuda-me a escrever este poema de amoras
Mansas, livres,
Com gestos de silêncio,
Com cansaços de quem merece as madrugadas!...
-
In As palavras são de água
. Foto Net

11 comentários:

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

édo amor que falo... e falas muito bem.

um poema terno e bonito de que gostei muito.

Beij

GarçaReal disse...

Quando as madrugadas chegam , as rosas já floriram, as amoras já se libertaram e caíram e deram lugar ao amor num poemar de grande fulgor, onde o toque confere ao sentir o desejo do " não partir".

Este é um os poemas que mais gosto, pois as palavras fluem mesmo como a água ...É de uma beleza infinda.

Bjgrande do Lago

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Meu querido Eduardo

Sabes...lendo este poema, não sei porquê vi-me num campo de papoilas, no meu amado Alentejo.

E eu não tenho mais palavras, meu amor,
Senão conchas em repouso sobre as rosas do
Regresso.
Ajuda-me a escrever este poema de amoras
Mansas, livres,
Com gestos de silêncio,
Com cansaços de quem merece as madrugadas!...

Simplesmente maravilhoso...não tenho palavras.

Beijinhos com carinho
Sonhadora

rosa-branca disse...

Acho que voei num campo verdejante iluminada pelo acenar das dunas. Encontrei as palavras que perdeu e docemente adormeci nos gestos do silêncio. Lindo demais amigo Edu e quem fala assim de amor é com certeza um romântico incorrigivel. Adorei. Beijos com carinho

Manuela ramos Cunha disse...

Eduardo,
Os teus poemas são muito bons! Daqueles que deveriam fazer do autor "O célebre Poeta"!

A tua poesia é encantadora, na medida que visualiza um banho de sentimentos promiscuos (no bom sentido)que não deixam ninguém indiferente aos apelos poeticos, que eles mesmo traduzem em palavras. Umas rebuscadas - mas nem tanto - a maioria, de uma simplicidade assimilante que acaba sempre por traduzir o estilo, a marca, o enlevo que o AUTOR LHE QUER DAR.

Gosto muito da tua poesia, entra sempre bem dentro do meu ser.

Eduardo, és já uma estrela, falta apenas brilhar por esses horizontes adentro. Acredita!

Só agora é que reparei? Ah! Ah! Pois foi agora a revelação, o clic que deu em mim. Desculpa...eu sei que só alertamos, quando espevitamos a mente, e, foi o caso.

Beijinho com sabor a amoras,
Nela

gota de vidro disse...

Porque o amor é a vivência de momentos fabulosos e em união, que marcam o presente e o futuro e nos mostra que escorre belo ao longo do corpo e do coração como se as palavras fossem de água... :)

Bom fim de semana

Bjitos da gota não de água , mas de vidro

Lucília Benvinda disse...

Ousado, como o amor deve ser.

Vou colocar aqui uma frase que li (vi) no filme Moulin Rouge: "O mais grandioso que poderás aprender é, apenas, amar e ser retribuído."

E o teu poema trata disso:
A dádiva total dos corpos às águas
Que desabam das montanhas...

Um abraço nesta noite que só o Amor pode aquecer.

tulipa disse...

Amigo
Falas do Amor e falas muito bem...
Bonito poema.
Obrigada pela partilha.

Hoje estou "encurralada" num quarto de Hotel no Fundão, furiosa com o estúpido dia que aqui passei. Vim eu fazer mais de 300km para ver lugares que não conheço e o tempo metereológico não ajudou nada...que raiva!!! Nem uma foto consegui fazer, com esta chuva forte e a neblina que se instalou.
Felizmente trouxe comigo o portátil e cá estou "ligada" ao resto do mundo.
Boa semana. Beijos

De uma outra forma vou dizer o que hoje sinto:

Casas há que habitam o meu subconsciente
Hoje estavam mesmo à frente
dos meus olhos
parei o carro e admirei-as

Aldeia histórica de Castelo Novo
ali estavam elas, lindas
quis captá-las com
a objectiva da máquina
os meus segundos olhos
mas...a chuva não permitiu
que raiva!!!

A neblina e a chuva
são os elementos que "hoje"
ilustram a paisagem.
...
e, a minha alma chora!

JB disse...

Eu sempre disse que a neve não é fria, que o Inverno é a estação mais quente e que o calor humano se sente como nunca!

Este seu poema, recheado de belíssimas imagens iluminam a candura que só o amor traz consigo.

Muito belo!

Beijinho

utopia das palavras disse...

Doce, como a água do rio que corre dentro de ti
Sereno, como o leito translúcido que é teu acariciar das palavras
Intenso, como um verdadeiro poema de amor!

Grata por escreveres desta maneira bonita!

Baila sem peso disse...

Que lindo, Eduardo!!!
Música a bailar na doçura
do Verbo que nos faz delirar!

Beijo