Na última noite, sob um calor infernal, estive sem energia em casa, o que é perfeitamente natural, mas estava sem gerador, pois tinha ido para uma actividade de trabalho e veio com problemas…Resultado, à luz das velas e com o que me restava da bateria do portátil, inspirei-me para escrever a crónica semanal…
Reflicto sobre os vários privilégios que tive ao longo da vida. Entre os mais essenciais estão a educação e a possibilidade de ter uma “família”, da forma como a vemos nós ocidentais. Penso nos miúdos e jovens que tenho conhecido aqui e nas suas tão grandes limitações. Uma rapariga estudiosa e responsável que teve bolsa de estudo para ir para a faculdade em Portugal, mas que não obteve visto, e por isso, aqui ficou. Um rapaz que sonhava estudar arquitectura, mas que não conseguiu, por varias vezes, obter visto. Agora já tem mais de 21 anos e não pode ter bolsa nem visto de estudante…e tantos outros. Em São Tomé não existe um verdadeiro ensino superior, a massa critica vem de fora. Estes jovens falam com revolta, outros simplesmente resignaram-se e vivem doutras coisas. Mas que impacto têm estas decisões nas suas vidas?
Penso em mim e em todas as possibilidades que me foram oferecidas. Se quisesse, estudava noutra faculdade, noutra cidade, noutro país. Questão essencial: podia optar e decidir o meu futuro. Estas pessoas, na sua grande maioria, não podem. Pus-me no seu lugar, e senti-me numa autêntica prisão. E fiquei ao mesmo tempo revoltada e triste por eles, e grata por ter tudo o que eles não tiveram. Escolas e ensino de qualidade (comparadas com as de cá, sem dúvida!), estímulo para aprender e conhecer coisas novas, pais que escutam e incentivam a seguir adiante, com todos os custos que também tiveram, fronteiras abertas para seguir o meu caminho desde que me esforçasse para isso. Sim, sinto-me grata e privilegiada.
E vejo-os a eles presos num ciclo vicioso.
Devemos todos dar valor ao que temos pois NADA é certo, há quem nunca tenha provado um sugo, folheado um livro, recebido uma prenda, tido uma roupa novinha em folha e deixado sobras num jantar por haver tanta fartura...
Boa semana a todos!
Rita
13 comentários:
É Rita o pouco que temos por vezes é muito comparado com muitos que nada tem.Beijinhos
É verdade. Tens toda a razão. Vamos aprendendo a relativizar. Temos tanto comparando...e tão pouco! Muitos beijos para ti, Rita.
Rita, é importante que dês a conhecer, em contraste com a tua vivência, as muitas dificuldades dos S. Tomenses, as barreiras que se colocam no futuro da juventude, os sonhos perdidos dos poucos que anseiam ter acesso a uma educação especiaizada!
Sinto-me orgulhosa por ti!
beijos da Mãe
M. Augusta
QUERIDA RITA, BELÍSSIMA CRÓNICA AMIGA... É TRISTE TANTA JUVENTUDE COM PONTÊNCIAL, VER AS SUAS ASPIRAÇÕES POSTAS DE LADO ... MUITA VEZ POR FALTA DE BOA VONTADE PARA REVOLVER AS SITUAÇÕES BUROCRÁTICOS... AMIGA UM GRANDE ABRAÇO...GOSTEI MUITO, ATÉ Á PRÓXIMA...
fERNANDINHA
Rita, a tua crónica é crua, como a realidade que descreves. Um país com quase todas as limitações que 30 anos de independência já deviam ter minorado! Os que só comem e bebem ideologia deviam fazer um estágio em países assim. Sinto-me orgulhoso por te identificares com as pessoas e os seus reais problemas. Não és uma pessoa de gabinete, és uma profissional do terreno e por isso falas do que vês e sabes. Estás muito crescida, minha filha, e obrigado pela tua crónica. Estamos desejando voltar a S. Tomé. Se Deus quiser, lá pró Verão. É uma paisagem riquíssima, onde a natureza tudo dá, mas onde faltam políticos a sério e amigos do povo. Mas se fosse só em S. Tomé! Beijoca.
Teu pai.
Eduardo
PS: Beijos do Gwyn, do Novelo e da maluca da Lai-si.
Ao ler este relato fico comovida com tanto sonho perdido, com tanta vida adiada...
De repente, penso: não somos nada, não valemos nada como cidadãos e políticos desde que não deixemos os rios correrem para os mares.
É triste saber que esses e tantos outros jovens olham o horizonte e só vêem a linha que os separa do resto do mundo e os encurrala nesse círculo vicioso.
Lamento por eles, Rita, e lamento por ti, pois sei que não deve ser nada fácil tomar plena consciência dum facto e não poder agir, apesar de agradeceres todos os meios que te foram facultados em comparação com os desses jovens.
Tenhamos fé que um dia tudo muda, tudo há-de mudar, quando despertarmos todos desta cegueira colectiva que faz com que a balança do mundo nunca esteja em equilíbrio.
Rita, envio-te um grande abraço de solidariedade e outro a esse Povo S. Tomense que tanto cuidas.
Lucy
é assim, rita, comparações de vida, do que existe e mesmo do que nem existe!
esse país está mostra lições de vida a meditar...
beijinhos
O teu último parágrafo é uma lição!
Tudo de bom, Rita
*
um narrativo texto,
com uma sensibilidade
pouco usual,
,
parabens Rita,
,
um mar de felicidade, deixo~te,
,
*
Adorei esta tua crónica...e escrita à luz das velas na precaridade...soou ainda mais bonita...pena que o mundo seja assim e o sol não poder brilhar para todos de igual maneira...
Jinhos mil
Olá, em primeiro gostava de perceber se a tua crónica terá um dia fixo, ou será consoante a tua inspiração e gerador disponível:)?sabes que gosto de procedimentos. Agora a sério...interessante a tua entrada, pq uma das reflexões que fiz quando estive em STP, para quê ter um Pais tão lindo e depois tão pobre em quase tudo o resto??contudo e não me perguntes porquê agora sp que leio as tuas crónicas, penso em PT, em que a prisão não existe "fisicamente" mas é uma realidade sentida por muitos (e por diversos motivos).Será que merecemos ser chamados de pais desenvolvido...
Em resposta ao último comentário, sim, a crónica irá depender de alguns factores que muitas vezes me ultrapassam, como a energia e internet. Mas aponto sempre para ser lançada às segundas feiras.
Já agora, suponho que te conheça de São Tomé..ou não?
Rita
Querida Rita,
Peço desculpa, pensava que tinha assinado o meu último comentário, mas pelos vistos não...conheces de STP e de PT.
Bjs CF
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