quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Poeta convidada da semana: Ana Luisa Amaral

Newton ou o exíliio
Alargando o compasso,
ele organiza o mundo,
parece repetir,
correcto e lento,
o que a razão calcula revelar.
E assim exila para sempre
o sonho.
Mas nessa correcção
premeditada,
não há sossego, nem sequer amor:
só tempo aprisionado
a solidão, paz trocada por paz
- igual a lento esvoaçar
sem asas.
Alheio é-lhe o fulgor
da criação coincidente à queda,
alheio é-lhe também o erro
mais terrível:
a glória de sentir nas mãos um fio de terra,
sustendo um fio de luz.
À luz de um sol perfeito e frio,
calcula,
os pontos do compasso
medindo e limitando,
e acerta, exacto,
o mundo.
Deixará descendentes,
será mestre
dos que hão-de vir
em hordas pelos tempos,
o compasso nas mãos,
cobiçando por jardas as fronteiras
rente à periferia do olhar.
Mas não verá dragões,
nem faunos, nem sereias,
nem terá unicórnios a seu lado,
nem saberá bordar tapeçarias
em sépias de explodir pupila e mares,
nem nunca tecerá a dor e a alegria.
E nunca serão suas profecias,
nem lerá revoadas de estorninhos
em dança inter-estelar.
Frio e ausente,
emoldurado a frio,
será dele o compasso
- e a solidão.
Só - pulsará no tempo
o coração
daquele que o criou.
Ana Luísa Amaral
( Do livro. " Entre dois rios e outras noites "

5 comentários:

Maria disse...

Tomo um chá contigo e com a tua convidada....

Obrigada.

Beijo

Unknown disse...

Claro, si, Maria, quando lo quieras, entonces, com mucho guesto. Me dirás como.
Bejo.
Eduardo

Isamar disse...

Se gosto! Obrigada pela leitura que me proporcionaste.

Beijinhos

Bem hajas!

Paula Raposo disse...

Não conhecia. Obrigada pela partilha. Bjs.

Lúcia disse...

Belíssomo, Eduardo.
Bjos